MATÉRIA E ESPÍRITO II
Jung argumenta que se pudéssemos ter a consciência do espírito de época reconheceríamos a nossa tendência atual de buscar explicações, preferencialmente no âmbito físico, pela razão de que no passado recorreu-se abusivamente a explicações por meio de espíritos. A partir da grande verticalidade da Era Gótica, desenvolveu-se a tendência horizontal na mentalidade do Homem. Superestimamos, agora, as causas materiais e acreditamos haver encontrado a explicação correta movidos pela ilusão de que conhecemos melhor a matéria do que um espírito metafísico.
Mas, continua Jung, a matéria nos é tão desconhecida quanto o espírito. Nada sabemos a respeito das últimas coisas. Esta constatação seria a capaz de restabelecer o equilíbrio entre o espírito destas épocas. Mas isto não quer dizer que Jung negue a estreita vinculação que existe entre a mente, a fisiologia do cérebro, das glândulas e do corpo em geral. Nada, porém, impede a especulação intelectual de ver, na psique, um fenômeno bioquímico complexo. Ou, pelo contrário, de declarar que a ausência de regras que impera no íntimo do átomo seja uma atividade espiritual.
Jung percebeu que o campo mais promissor para as pesquisas futuras em Psicologia estava em conexão com a Física Quântica. À primeira vista parece pouco verossímil que se encontre relação entre a Psicologia e as abstrações da física das partículas subatômicas (Mecânica Quântica). Mas, ele ressalta que o aspecto evidente desta conexão reside no fato de que os conceitos básicos da Física, como: espaço, tempo, matéria, energia, campo, partícula, etc. teriam sido, originalmente, idéias intuitivas semi-mitológicas dos velhos filósofos gregos. Idéias que foram evoluindo vagarosamente e acabaram por se tornar precisas hoje em dia. E, agora, expressas em termos matemáticos rigorosos.
A noção de partícula, por exemplo, foi formulada no Século IV a.C. por Demócrito que a chamou de átomo, isto é, unidade indivisível. A noção de energia e sua relação com força e movimento também foi formulada por antigos pensadores gregos e desenvolvida pelos partidários da filosofia estóica. Postularam a existência de uma tensão criadora de vida (que chamaram de tonos) que seria
Fls. 02
fundamento de todas as coisas. É evidente que esta aí o germe do nosso conceito de energia. Estes são dois dos muitos eventos que dá Jung e são reveladores de que, mesmo conceitos modernos e basicamente científicos, permaneceram durante muito tempo ligados à idéia arquetípicas da humanidade pertencentes ao inconsciente coletivo. As descobertas recentes da Física não expressam, necessariamente, fatos objetivos e se originam de tendências inatas do Homem.
O físico Werner Heinsenberg – talvez, o principal formulador da Mecânica Quântica com o Princípio de Indeterminação – tem uma frase antológica que é a seguinte: “- O Homem, ao examinar a natureza e o Universo, em lugar de procurar e achar qualidades objetivas, encontra-se a si mesmo”.
Wolfgang Pauli, outro grande nome da Física Quântica – prêmio Nobel de Física em 1945 como descobridor de uma partícula atômica básica: o neutrino, junto com outros cientistas, começou a estudar o papel do simbolismo arquetípico no domínio dos conceitos científicos. Pauli acredita que devíamos conduzir nossas pesquisas de objetos exteriores, isto é, da natureza, paralelamente a uma investigação psicológica da origem interior dos nossos conceitos científicos. Jung passou a trabalhar em estreita colaboração com Pauli por causa de suas afinidades com este cientista e chegou à conclusão que a Psicologia por ele formulada e nomeada como Psicologia Analítica era obrigada, por causa de suas investigações, a criar conceitos que mais tarde se revelariam incrivelmente semelhantes aqueles criados pela Física Quântica.
Um dos mais importantes conceitos da Física moderna é a noção de complementaridade (principalmente formulado por Niels Bohr, o grande rival de Einstein em suas famosas discussões). A Física descobriu que só se pode descrever a luz através de dois conceitos complementares (e, por isso, se fala em complementaridade), mas estes conceitos são logicamente contraditórios. A luz, por exemplo, é uma onda e também uma partícula. Sob certas condições de experiência, a luz se manifesta como se fosse composta por partículas. Em outras condições, como se fosse uma onda.
São, também, conclusões da Mecânica Quântica que só se pode observar detalhadamente, ou a posição ou a velocidade de uma partícula subatômica, mas não ambas ao mesmo tempo. O experimentador tem de escolher o que vai medir com precisão. Mas, ao escolher, sacrifica um ou outro resultado. Heinsenberg conseguiu deduzir uma equação famosa que nos dá o grau de precisão de uma ou outra destas qualidades (posição ou velocidade de uma partícula). Além disso, concluiu que a observação em si influencia decisivamente a experiência, modificando-a.